Ação do Instituto nos Ministérios no Brasil motivou a abertura de inquérito policial naquele país para a apuração do caso, ao passo em que processos foram desarquivados; Athos, de 4 anos, havia sido colocado para adoção
Após o Instituto Brasileiro de Atenção e Proteção Integral às Vítimas (Pró-Vítima) intervir, em fevereiro deste ano, junto aos Ministérios da Mulher, das Relações Exteriores, e da Igualdade Racial, o drama da brasileira Raquel Bezerra do Vale, de 35 anos, que chegou a perder a guarda do filho, Athos, 4, para o governo da Dinamarca, país onde vive desde 2020, pode ter um novo fim. A Justiça do país escandinavo reverteu a decisão da Vara da Família e concedeu a custódia unilateral da criança para a mãe.
Mesmo com a guarda do filho concedida pela Alta Corte da Dinamarca, Raquel ainda depende do agendamento de uma nova audiência judicial para sacramentar a volta de Athos para o convívio diário. Atualmente, a brasileira tem o direito de visitar o filho uma vez por mês e por apenas três horas. Desde que foi colocado para adoção, há três meses, a criança está sob a tutela de uma família dinamarquesa.
A expectativa é que, dentro dos próximos meses, a Justiça da Dinamarca permita que Athos volte a morar com a mãe. Durante esse período, o Pró-Vítima continuará acompanhando o caso e provocando as autoridades locais para que Raquel tenha seus direitos garantidos de maneira plena. Procurado pela brasileira, foi o Instituto que interveio no caso, provocando, em fevereiro deste ano, os Ministérios da Mulher, das Relações Exteriores e da Igualdade Racial, no Brasil.
A promotora de Justiça Celeste Leite dos Santos (MP-SP), presidente do Pró-Vítima, acredita que o trabalho da entidade foi importante para que na Dinamarca fosse aberto um inquérito policial para uma melhor apuração do caso de Raquel:
“Tirar o filho de uma mãe não nos parceira razoável, ainda mais sendo uma mulher vítima de violência por parte do ex-marido, que está preso. A Alta Corte dinamarquesa reconheceu a pressão feita pelo governo brasileiro, mas a Justiça precisa, de fato, concluir o caso, restabelecendo a volta de Athos para o convívio de Raquel”, reforça Celeste.
A jurista lembra que a medida adotada anteriormente pela Prefeitura de Høje-Taastrup reconheceu a falência do sistema protetivo de mulheres e de crianças daquela nação. Celeste também não descarta racismo e xenofobia - aversão, preconceito, hostilidade e/ou rejeição a pessoas de outras nacionalidades ou culturas - no caso de Raquel:
"Após este esforço conjugado do governo Brasileiro, do (Instituto) Pró-Vítima e do Grupo Vítimas Unidas em favor da Raquel, aguardamos que sua repatriação aconteça com celeridade. Que estas vítimas (mãe e filho) possam reconstituir a unidade familiar no Brasil. A entrega da criança a terceiros desconhecidos é ato de violência e de desumanidade sem precedentes".
Entende o caso
Há cinco anos, Raquel, que trabalhava como representante comercial em São
Paulo, se casou com Rasmus Grarup Nielsen - hoje, preso por ameaçar servidores públicos. Com o dinamarquês, teve Athos, e passou a viver em Høje-Taastrup, município do Condado de Copenhaga. Após muitas brigas, episódios de violência e até relatos da criança de possível estupro à mãe (crime praticado pelo pai do menino e, inclusive, denunciado às autoridades dinamarquesas), a brasileira conseguiu se divorciar.
Contudo, por ter de se mudar várias vezes de endereço, por conta de perseguição do ex-marido, o governo dinamarquês entendeu que Raquel não tinha condições de criar Athos e caçou a tutela.
A Dinamarca é conhecida por aplicar testes psicométricos em imigrantes para medir a “competência parental” e resguardar a cultura e os costumes locais - o que resulta, muitas vezes, na retirada da guarda de crianças de mães e de pais, sendo as mesmas destinadas, posteriormente, para adoção.
Para Raquel, a decisão da Justiça dinamarquesa representa a esperança da volta de Athos, mesmo sem saber quando isso vai acontecer:
“Agora, que conseguimos reverter a decisão da guarda na Justiça, espero que o retorno do meu filho aconteça o quanto antes. É desumano vê-lo apenas um dia no mês. Precisamos, os dois, acordar desse pesadelo”, desabafa a brasileira.